Wednesday, December 29

Respiração circular

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A minha infância foi marcada por violentos ataques de asma provocados por reacções alérgicas. E até nem me queixo, porque esta reacção em cadeia levou-me a certas actividades, entre as quais à música e à práctica um instrumento musical (ainda que de sopro) como método profiláctico. O que é certo é que elas lá estavam, as pieiras e as espectorações e o indescritível terror de sentir asfixia, mesmo com a cabeça fora da janela e a boca escancarada para o vento norte.
Talvez fosse então normal, que um dos maiores obstáculos técnicos com que me deparasse ao tocar fosse a respiração. Sentia-me inibida musicalmente por este factor. O que é certo é que cheguei a odiar a pobre flauta e certas frases musicais mais longas (de J.S.Bach, imagine-se) pela modesta réplica que constituiam dessas horas de aflição. Olhava, invejosa, para pianistas e instrumentistas de corda, sobretudo violinistas (e aqui refiro-me à performance dos instrumentos musicais e apenas isso, bem entendido).

As dificuldades passaram com os anos e com o desenvolvimento técnico (os problemas de ar, não a inveja dos violinistas) e aprendi a sentir-me confortável com a capacidade respiratória, tendo mesmo esta periodicidade e ritmo orgânicos sido mestres na compreensão da frase e no fluir musical.

Ninguém ouve música em apneia e uma má gerência da respiração, mesmo para um músico sem ser de sopro, pode ser fatal para a comunicação.

No entanto, ainda tendo conseguido inserir a respiração no discurso musical de uma forma saudável, não deixei de sentir o fascínio pelos instrumentos que não dependiam directamente da respiração. Ou melhor, sempre me perguntei como seria fazer música sem este tipo de - quer queiramos, quer não - limitação.

(para continuar)

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